Yakutsk

Penso em Yakutsk, a cidade mais fria do mundo
que me assinalaste no mapa com os dedos nus, tiritantes

mostravas o leve desejo de experimentares
a vida da civilização em condições de congelamento,
uma hibernação lúcida sob paredes volumosas,
radiadores, sistemas complexos de aquecimento,
onde não tivesses que fugir do Sol e outras vitalidades,
o teu corpo encolhido ajustando-se ao retraimento
e ao mesmo tempo longe da tundra –

estás radiosamente protegido
no hermetismo calafetado de uma habitação pobre,
de um túnel ou de um veículo cujas janelas
se converteram em vidrarias de gelo
onde ressumbram as formas vacilantes do teu rosto,
os teus dedos ainda mais tremulosos

em Yakutsk levas a vida o mais distante de mim, até ao fim,
uma glacialidade que sempre me gelará,
um abrasamento interino que eu sempre ignorarei,
nessa terra onde uma sepultura demora três dias
a ser cavada no solo congelado
e os corpos têm de esperar em cima,
na superfície tumular que dá guarida só aos vivos

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