Era domingo e meu pai estava à procura de uma tevê pro meu avô. Buscou nos classificados alguém que estivesse vendendo alguma que o preço fosse compatível com o seu orçamento. Achou! Verificamos o endereço, não era tão perto da nossa casa, mesmo assim fomos. Salvo engano era na zona sul da cidade, zona oposta a nossa.
Era num condomínio. Fomos anunciados e ela nos recebeu. Lembro bem daquele apartamento, quente, pequeno, e bagunçado. Quase não tinha mobília nele, nos relatou que já tinha vendido quase tudo, ia embora pra Brasília. Recordo que era bem comum as pessoas deixarem Teresina e migrarem pro Centro-Oeste ou Sudeste. Voltando ao apartamento, tinha sobrado a tevê, um colchão velho e manchado, uns lençóis que tinham a missão de cobrir aquele colchão sujo (falhavam miseravelmente), uns cd’s espalhados pelo chão, uma geladeira, e o fogão.
Eu não estava preocupada com a tevê, isso era assunto dela com meu pai, me interessou a pilha de cd’s. Questionei-me se ela os levaria. Comecei a bisbilhotar, e dei de cara com um da Marisa Monte, “Barulhinho bom”. Capa maravilhosa, uma mulher com os seios de fora. Era duplo, e os cd’s eram igualmente ilustrados com formas femininas nuas, um mostrava os seios e o outro uma mulher de costas, nua. Um era ao vivo, o outro gravado no estúdio.
Fiquei ouriçada, conhecia pouco dela, desse pouco sabia que era bom. “Bem que se quis” já era bem famosa, e talvez fosse a única que eu conhecesse. Como não custava nada perguntar, indaguei logo se ela os levaria com ela. Disse-me que alguns. Já fiquei um pouco triste, por fim, mostrei o da Marisa, e ela disse que eu poderia levá-lo. A essa altura meu pai já tinha fechado negócio com ela e se aprontava pra colocar a tevê no bagageiro do carro. Voltávamos os dois felizes: ele pela compra e eu pelo cd.
Passei a semana me deliciando com aquele cd. O final de semana chegou novamente e viajamos pra deixar a tevê pro meu avô. Ele não curtiu muito, achou antiga demais, mas era a que meu pai podia lhe dar. Depois ele aceitou e ficou por isso mesmo.
Alguns anos depois, com uma condição um pouco melhor, meu avô trocou de tevê. Passado mais um tempo depois, ele faleceu. Não sei o paradeiro de nenhuma das tevês que ele possuiu. Quanto ao cd da Marisa, ele continua comigo, guardado como relíquia, me fazendo lembrar sempre desse domingo que o adquiri.