Todos os dias um verme come meu fígado.
Fico sem pernas e braços que façam alguma coisa.
Resta um coração com artéria e veia já engorduradas,
um sangue que chega sem vontade
e sai com pouca disposição.
Todos os dias eu gasto água para lavar as tripas,
amolecer a sujeira que eu mesma produzi.
Gasto horas purgando o estômago
a ver se expulso o que me corrói.
Todos os dias, um frente ao outro,
continuamos o jogo perdido.
Exercito me enxergar no verme
e cada vez descubro uma parte minha que está nele.
Cada vez recupero-me
e a bile desbasta as gorduras que excedem
limpa as sobras do que não serve.
Todos os dias nos vemos no espelho
e já não baixo os olhos.
Pressinto o dia em que serei inteira
a as minhas vísceras serão o próprio fogo.